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Alta liderança precisa se envolver na política de vagas afirmativas

Podcast da Fundação Dom Cabral mostra o valor das vagas afirmativas e como as empresas podem endereçar essa questão

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por Redação julho 1, 2022
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Cerca de 51% dos alunos de universidades federais são negros, mas essa representatividade não se replica no ambiente empresarial, segundo Juliana Kaiser, professora convidada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além de diretora executiva da divisão fluminense da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH). “Não vejo nenhum terço disso nos ambientes corporativos que frequento no dia a dia”, reforça. Juliana foi uma das duas convidadas do FDC Debates, edição 14, podcast da Fundação Dom Cabral, cujo tema foi “O Valor das vagas afirmativas”.

Fundadora da Trilhas de Impacto, organização que tem como foco “reduzir as desigualdades, criando projetos que promovam o desenvolvimento sustentável e a justiça social”, Juliana foi ela própria um exemplo de transformação pela educação: foi pioneira na Universidade Federal do Rio de Janeiro em acolher os alunos cotistas negros e em se envolver na inserção deles no ambiente acadêmico. Para ela, seus colegas professores brancos não estavam preparados para receber os alunos cotistas que ingressavam na UFRJ. O aprendizado de luta por igualdade na universidade a levou a trabalhar a mesma questão em ambientes corporativos, onde tem atuado.

RH precisa se preparar para a diversidade

Juliana lembra que a discussão sobre vagas afirmativas ganhou destaque, infelizmente, com a repercussão do assassinato de George Floyd, nos Estados Unidos. Ela também destaca que o cumprimento das metas de diversidade racial nas empresas tem sido impulsionado pela pressão de investidores em empresas com papeis indexados em várias bolsas de valores, inclusive Nasdaq. “As empresas precisam disponibilizar indicadores de igualdade racial”, lembra Juliana. Ela destaca que nos Estados Unidos, com os negros representando cerca de 13% da população, a participação racial nas corporações é muito maior do que o Brasil, cuja população negra representa pelo menos 54% do total.

No seu trabalho de educação , Juliana exemplifica a realidade de várias interações que tem no mundo corporativo, onde na maioria das vezes é a única pessoa negra. “Participo de muitas conferências virtuais e quando as telas se abrem sou a única negra. Nos Estados Unidos, pelo menos a metade das telas é formada por pessoas negras”, comenta. Para a especialista, é necessário que exista um ambiente de acolhimento para as pessoas que ingressam nas corporações via vagas afirmativas, mas é fundamental que a alta administração se envolva ativamente no processo.

Como diretora da ABRH-RJ, Juliana argumenta que a presença de profissionais negros nas empresas acontece em cargos auxiliares e que, em grande parte, eles não ultrapassam o nível de analista, sem poder de decisão. Quando acontecem de estar em cargos de liderança, os profissionais negros são obrigados a adotar várias iniciativas para reafirmar o conhecimento que detêm. O processo discriminatório começa, aliás, na etapa de seleção, quando o candidato negro, de formação universitária, é constrangido a informar se sua entrada em uma universidade de renome aconteceu via cota racial. “As pessoas não têm noção do quanto essa pergunta é racista”, explica Juliana.

Vagas afirmativas em micro e pequenas empresas 

Kaká Rodrigues, professora convidada da FDC e cofundadora da consultoria Diversidade Agora, também participou do podcast do FDC. Ela tem uma longa experiência com o tema vagas afirmativas e acrescenta que algumas métricas podem estar superestimadas pelo fato de considerar a realidade das multinacionais ou grandes empresas locais, nas quais a diversidade tem sido adotada como política corporativa. Kaká destaca que a maior parte das vagas de trabalho no país estão em micro e pequenas empresas, onde o tema vagas afirmativas não é necessariamente considerado. 

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“Tivemos um avanço gigantesco do final do século passado para agora, com as políticas afirmativas nas universidades, mas isso ainda não se reflete no ambiente organizacional das empresas”, argumenta. Para Kaká é raro a existência de pessoas, mesmo na área de RH, que sejam familiarizadas com a questão das vagas afirmativas. Esse fato também colabora, segundo ela, para que a maioria dos cargos exercidos por pessoas negras ainda seja de auxiliar e, no máximo, analista. “Temos um despertar, mas ele ainda é bastante tímido para a questão de igualdade racial”, argumenta.

Para que o processo avance, Kaká avalia que é necessária uma transformação cultural nas organizações e que a alta liderança invista na diversidade, de forma que as pessoas negras sintam-se integradas no ambiente de trabalho. Os benefícios da diversidade estão comprovados em pesquisas, lembra ela, como a realizada pela McKinsey, que apontou um incremento de 33% em rentabilidade nas corporações que abraçaram o tema em relação a quem não considerou a questão. “Não basta ter metas, mas também ações concretas para que se inicie um círculo virtuoso”, finaliza.




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